Um artesão que transforma velhos troncos de madeira em obras de arte
Reportagem e fotos Marcos Cirano
O nome dele é José Bezerra. Filho de um barbeiro, viveu da roça até o final de 2002, ano em que iniciou uma nova profissão: a de artesão em madeira. Ele produz verdadeiras obras de arte em pedaços de pau que encontra na região onde mora, a zona rural do município de Buíque, mais precisamente o Vale do Catimbau, no Agreste de Pernambuco.
José Bezerra expõe no terreiro de casa todas as peças que entalha com facas caseiras ou estiletes: cabeças humanas, animais, imagens de santos, entre outras. Sua pequena moradia, uma construção em taipa, fica à beira da estrada que corta o Catimbau. Assim, ele tem como grande clientela os turistas que periodicamente vão conhecer as maravilhas do Vale.
Na sua nova profissão, José Bezerra está feliz. Ele diz ganhar, mensalmente, o bastante “pra sustentar a família” (mulher e cinco filhos), coisa que não ocorria quando ele trabalhava alugado na agricultura. “Se existe outro céu, hoje eu tô num”, comenta o artesão. Os preços das peças que Bezerra produz variam de modestos R$ 10,00 até “não sei quanto, depende do produto”.
O artista do Catimbau, como Bezerra é conhecido, utiliza os variados tipos de madeira encontrada naquela região: angico, maçaranduba, umburana. Explica que a melhor delas é a umburana (por ser mole, fácil de entalhar) e diz que “esse negócio de escultura” ele não herdou de nenhum outro mestre, não: foi uma coisa que lhe apareceu num sonho, “tirada do juízo”. Ele explica:
“Foi assim: teve uma época aí que a vida na roça tava muito difícil, eu até vivia passando fome. Aí, quando foi uma noite, eu sonhei com uma voz me dizendo: ‘Zé, tu sois um artista, teu destino é desenhar, teu destino é fazer desenho’. A voz falava e me mostrava uma cara de gente. Então, desde esse dia, eu comecei a trabalhar nessa arte e não parei mais.”
José Bezerra já perdeu a conta do número de peças que entalhou até o momento em que concedeu esta entrevista, março de 2005: ele acredita que foram em torno de umas duzentas. A história do sonho, segundo ele, é o que poderia justificar a predominância, em sua obra, de caras humanas. Mas ele diz que não tem o direito de escolher aquilo que vai entalhar:
“Eu faço o que a madeira quer. Se o tronco que eu encontro por aí é parecido com um bicho, aí já tá decidido que a peça vai ser um bicho. Agora, se o tronco que eu encontro por aí lembra uma cara de pessoa, dum cangaceiro, do que for, aí a peça vai ser essa cara. Eu sempre trabalho assim e até hoje não tenho do que reclamar. Sou um sujeito muito feliz.”
Além de artesão, José Bezerra é músico e compositor. Para compor e tocar, ele utiliza um estranho instrumento que construiu com um arame e um pedaço de pau, lembrando um berimbau, mas que ele chama de rabeca. Natural da cidade de Buíque, nascido a 20/03/1952, ele filosofa: “Sou um poeta. Acredito que dentro dessa minha cabeça eu tenho muitas coisas”.
Sobre um possível desmatamento que o seu trabalho de artesão poderia provocar na Vale do Catimbau, já que utiliza madeira nativa dali, ele diz ser improvável. Isto porque ele não derruba árvores, só trabalha com pedaços de madeira que encontra caídos no chão. “Deus me livre de derrubar uma árvore, porque a natureza é a esperança que não se acaba”.




